... Antes de morrer, me aprofundando num abismo, sem água e sem fundo, cheio de palavras inertes e inativas em qual mergulhar-me-ei, tenho de dizer que essa morte, por palavras obscuras, não é culpa de ninguém, não, como me disseram que não se vem ao mundo aos pares, assim também não se vai, é como se corpos juntos e corações compartidos nunca existissem, minha parede grega que o diga, é sofrida.
Tenho parado de ler F. Nietzsche, por que agora ele tem me dado conselhos em como criar uma teoria e resoluções sobre sombras, todas as noites; ele está lá, em meu quarto, com seu sotaque alemão, que tem me agradado bastante, principalmente quando se invoca à falar da politicagem de seu tempo, e sinto-me até aliviada de saber que é sorte dele, talvez minha, desconhecer a politicagem desse meu tempo.
Tenho lido Neruda, sim, porquê eu não suportaria ter que ouvir todas as noites aquele seu sotaque castelhano sucumbido, sussurrando aos meus ouvidos a indolência de seus poemas-vivos.
Numa dessas noites eu dei folga ao Friedrich N., e abri espaço ao W. Szpilman distorcido com a aparência de Adrien Brody, e ele ficou espatifando a noite inteira sobre O idiota, de Dostoiévski, (e no outro dia achei um link com esse texto em perfeito russo, não agüentei minha curiosidade), falou horas sobre existencialismo, e foi na veia hein.
Foi aí então preferi não dar mais folgas ao meu velho, nem abrir espaços para estereótipos com sotaque polonês.
Mesmo com a minha queda de deixar qualquer um boquiaberto pelo Sganzerla, ultimamente tenho preferido apenas assisti-lo, e tenho deixado o Meirelles de lado, e dando devaneios apenas para o que me deixa tão nubívaga, e isso à meses, o Glauber R.
Parei de ver TV faz quase um ano e meio, e rede nacional parei de ver à uns dois anos, mas para se sincera, nessas férias o tédio tem me abatido, e a tentação me deixa inquieta, então liguei a tv, para ver o quê estava passando, e talvez, quem sabe aquilo me agradasse.
Aí então tive um desmoronamento de aproximadamente três minutos, quando liguei em rede nacional que passava a novela das oito (se não me engano), fico parada, aí de repente ouço uma atriz falando os nomes “Kubrick e Truffalt”, comecei a observar e vi um quadro escrito o nome de Pasolini – como plano de fundo, uma cortina com desenhos e obras de arte estampadas de Roy Lichtenstein, um papel de parede rosa com folhetos iguais falando sobre avant-guarde, e um guarda-roupas de vidro, dividindo imagens de Warhola e Basquiat (se não me engano quanto as graffitagens de basquiat).
Belas decorações, mas isso tudo foi o basta, desliguei aquilo e decidi não ligar mais, por um momento me senti indo às lágrimas por saber que amanhã a maioria dos miseráveis desse Brasil inteiro vão se sentir tão cultos e cépticos, quanto aos verdadeiros interessados, apenas por assistir mais uma dessas novelas desmoralizadoras antes de ir dormir.
A maioria talvez nem saiba que está aspirando essa intelectualidade toda, talvez nem saiba que está sendo manipulada por uma grande mídia, a qual cria e põe a sociedade para dormir, e assim muda a personalidade de quem bem-entende, é muita hipocrisia mesmo, e ainda acham que estão jogando ao povo o quê provavelmente é certo. (são mais é um bando de desgraçados!).
E eu que pensava em fazer jornalismo, conviver com essa mídia, tinha esse sonho antes de assistir os malditos três minutos de manipulação por ver que tudo que aprendi a cultivar em quinze anos está passando aos baldes em menos de uma hora por dia, então decidi que realmente não quero estar no meio de tais medíocres, o quê é lamentável.
Tenho até pensado que quem ouve funk hoje, por influência de novelas passadas, daqui uns tempos estarão ouvindo música independente amanhã; depois de amanhã e depois sucessivamente vão construir outro novo padrão de brasileiros.
Pode até parecer estranho, mas três minutos de ‘poluição visual’ destruiu boa parte dos meus sonhos, tenho pensado no quê teria acontecido se eu estivesse assistido cinco minutos.
Numa dessas noites andei comentando com Byrne sobre essas coisas da tv, ele ficou espatifado, e me aconselhou não fazer parte dessa gente que passa de um dia pro outro saber tudo sobre as artes sem o mínimo interesse de admira-las e ama-las.
Então ao invés de ligar a TV, tenho preferido dar água para as minhas arvorezinhas e passar dicloro-difenil-tricloroetano por perto delas, por que eu acho que graças ao Paul Hermann a minhas plantinhas vivem mais tranqüilas, ou quase.
Tenho pintando alguns quadros também, se não me engano o meu ultimo foi uma tela a óleo preta-e-branca com um desenho-cartoon de Andy Singer, por que ainda não consigo desenhar críticas consumistas por conta própria, é, de fato essas férias tem me dado muito tempo de sobra.
Ando pensando, se todo mundo ouviu david byrne, pelo menos quem tem winxp, pela amostra de música ouviu, porquê que ninguém me fala ou comenta uma palavra sobre, sinceramente ele tem o sotaque mais deleitável que já ouvi, ganha até daquele sotaque alemão, mas fazer o quê né.
Eu estava tomando banho agora, e pensei em escrever qualquer coisa que acabasse com esse meu abismo sem fundo de palavras não ditas, e agora sem a minha percepção, nem sinto mais as minhas energias libidinosas, ultimamente uma grande bílis negra tem me predominado e meu inconsciente tem tomado conta de mim, e está cansado de tanto desdenhar.
E como não consigo à meses botar minha frustração pra fora, nem gritando, tenho me sentido morta, sem morrer, e nem abismos, nem mortes fictícias me matam mais.
Penso já que devo ir pro meu divã, ainda devo reservar alguma noite aí para o Milan Kundera pra discutirmos um pouco sobre o melhor livro da minha vida, A insustentável leveza do ser, em versão original, que eu emprestei à alguns meses e ainda não me devolveram, sinto falta de sentir as entre-linhas cheias de "Muss es sein? es muss sein! es muss sein".
Mas hoje eu reservei a noite com o Bertolucci, já que o meu velho Friedrich N. preferiu tirar por conta própria uma folga por uns dias de mim, e isso tudo por que eu andei contando a ele sobre o nosso carnaval, e ele me falou que eu estava enlouquecendo e que deveria parar de inventar estórias com nomes carnavalescos, reconheci e então preferi deixa-lo ir tomar chá por algumas noites com o Burckhardt para desabafar as mágoas, por que eu não agüentava mais ouvir contextos de niilismo.
Pode até parecer utopia e imaginação das minhas noites em branco com cara de quem nunca viu vera-efígie, mas eu sei o quê vejo e ouço, e ninguém pode me contrariar dizendo que minhas noites são reais ou irreais, cada um pode acreditar no quê bem-entender, sim.
Entranhei o tanto de lixo que tive vontade, e não impus linhas.